
A luz do sol na janela
Não é o sol – é a janela.
Chego tarde, e a indiferença
De quem viveu, à minha dor,
É o sacramento da angústia,
Ungida pelo não-vivido
E por quem o não viveu comigo.
Chego tarde.
Pelo chão os despojos
Vis, Clamorosos
São o pregão da ausência,
O riso gordo da hiena
A uma faminta ameaça
Já devorada a carcaça.
Chego tarde, e o que reside
Dentro do círculo do instante
São os ecos do que já não vive
A voracidade do Passado
Dilatando um grotesco ventre
Com a carne morta do Presente.
Ser o sobrevivente
Do clarão da vida
E ter tempo de sobra
E descer para a Hora
Do nada
Ainda de bolsos cheios…
Trincheiras são canteiros
Apodrecidos os heróis –
E a mim, doem-me os lírios!
Pudera eu ser pasto de martírios
Pudera com eles ter morrido –
A juventude, a paz, o poema –
Antes outro o escrevera
E eu fosse já só silêncio…
Dai-me o sol, dai-me o fogo
Levai os vidros onde morre
Mais que eu, a ideia possível
De mim.
E enfim, por uma vez
Não seria tarde mais,
E também eu, com os mortais
cansado de luz e de riso
Morreria de ter vivido.