Poemário

Equador

3 Novembro, 2017
the-ancient-of-days-1794
The Ancient of Days, William Blake 1794

Estar tão perto, tão certo

De uma incessante clareza –

E ver a lâmpada acesa

Porque se pestaneja

(E sempre, sempre

Se há luz, se pestaneja).

 

Ser redactor do milagre

De o milagre ser norma.

Exercer a liberdade

– “liberdade é emenda!” –

Ao cantar a sentença

“Não pode, não pode!”

 

Emendo –

 

Não posso:

Escrever sem consequência,

Além do Desaparecimento

(Escrevo à luz do desalento

De jamais desaparecer).

Ser na – branca – brancura

Lago sem margens da Morte,

Pulsando o vigor da ausência

Onde ausente é a procura… –

Escrever descreve a brancura.

 

Pudesse, pudesse…

 

Mas Palavra é preço,

Dizer é resto

Da conspurcação que se exige

À expressão do que vive –

Cancioneiro reduzido

A advérbio de Tempo!

 

Escrever, pensar, dizer

Sujam o vidro do intelecto –

Doces mentiras do Universo

Sugerindo a inexistência –

Tentam quem sou com a persistência

Indefensável

Do Instante.

 

Pudesse adiante

Ser escrito o regresso

À saturação do momento! –

Mas a expressão é o laço

A linha, a mão, o acto

Do Equador.

 

Fôra além da orla exterior,

Do rasto de tinta

Que é a denúncia

Da minha Humanidade –

Da minha incapacidade

De inexistir –

E como tudo o Resto

Seria tão indiferente,

Seria tão inabalavelmente

Pacífico,

Ausente.

 

Ah, se escrever não fosse

Ter nome de ladrão,

Louvar a condenação

Antes de ser abatido –

Talvez chegasse ter escrito,

Chegasse a não ter existido,

E sem mim que se inventasse,

Sem Outro que me ansiasse

– sã completude ausente –

Quem sabe eu fosse também,

Enfim,

Suficiente.

 

Mas não – não se escreve,

Sem a lâmpada acesa.

Vive, irmão –

E pestaneja – se há luz, irmão

Pestaneja…

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