Poemário

Ouro e Cinza

  No gume dos nossos estilhaços, No vazio pronto dos meus braços, Há ainda, intacta, Mais que a memória, a ameaça De termos estado juntos, os dois.   Não é retorno que espero Não te procuro, não te quero – É só uma fugaz impressão De luz que rasga o firmamento. Persiste ainda a solidão, […]

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Poemário

Benção a um cravo novo

    Manhã de Abril, de novo a treva Alastra dos tímpanos furados Pulsa Recolhe Avança Sobre um choro interrompido (instinto rude!), a um nado vivo.     De cima de ombros direitos Senhores dirão, Olhando em frente: A treva cessou para sempre Desde a antepenúltima vez.     Sepultam cravos em espingardas Rubor que […]

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Poemário

Fado da Virgínia

  Com duas pedras no bolso ao invés de um nó Escreves a verdade –  mentes se o dizes, “Nunca duas pessoas foram tão felizes”, Quando nunca uma pessoa esteve tão só.   No Estio avistas-te um Inverno sem termo, Hóspede em ti mesma, partindo, perguntaste: “Virgínia, Virgínia! – porque te abandonaste?” Porque em vida […]

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Poemário

Húmus

    A vontade que tenho De mandar a Saudade à merda – Pestilência sobreposta ao hábito de ser eu. Tirar-me, assente em lodo, de mim ou do lodo, Rasgar não fora sombra, morder chegasse a boca, Ao cordão umbilical – Carne infestada de borboletas, Ainda pousadas, como bestas Bebendo o sangue que infectaram, Engodos […]

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Poemário

Poema a um Tempo Novo

    Ainda há pouco te vi Partir hoje, ontem, sempre, Meu arquipélago resistente Ao rio escuro da alma. Olho hoje, ontem, sempre, A forma lisa da muralha, – pedra inteira Redonda – vejo alargar-se a fronteira, Por mais que a percorra.   Fosse o meu instante diferente Bebesse a seiva da fuga Aos prismas […]

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Poemário

Primavera, de quem fica

    A beleza não é senão uma sobra do mundo que marcha a combater a morte. Na luz ou no escuro as sementes caem Não sabem ser brancos suicídios alados Um esporo cravado nos gumes do vento – Parte breve do movimento Que tudo leva, menos a mim – sementes caem, simplesmente caem – […]

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Poemário

A Educação do Marinheiro

  No porto a Sul em que te encontro Duas mãos unidas numa duna Não soam sequer a uma voz.     Houve um dia – tenho pensado – Uma certa garantia De cada um de nós, no rasto, Ser sempre uma coisa nova. Para quê, então – se não somos – Beijar – mordendo […]

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Poemário

Auto-cartografia – Lisboa

Por mim anda-me, e eu deixo A rua breve de Lisboa Recomeça-me, confia-me Três mil anos de vícios Faluas, naus, terreiros Velas intactas de fenícios Fogueiras, breus, ofícios Sedimentos de gente Sobrepostos, empilhados Sobre os olhos abertos À irreal vida de um lugar   É na ideia de si e lá Que a lucidez arrefece […]

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Poemário

Pronunciar Sophia

    Pudesse tudo ser limpo Em sal e sonho reescrito Na esfera lisa da Palavra   Pudesse a sibila ordenada No templo nu da Poesia Pudesse a pronúncia de Sophia   Comandar o fel das ruas Os claustros os povos o cansaço A retomar em novos braços A vocação de miradouro A exaltação de […]

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Poemário

Equador

Estar tão perto, tão certo De uma incessante clareza – E ver a lâmpada acesa Porque se pestaneja (E sempre, sempre Se há luz, se pestaneja).   Ser redactor do milagre De o milagre ser norma. Exercer a liberdade – “liberdade é emenda!” – Ao cantar a sentença “Não pode, não pode!”   Emendo – […]

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